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Carta de Despedida da Vesper

Trecho do livro Casino Royale de Ian Fleming

“Meu querido James:

Amo você com todo o meu coração, e enquanto você lê estas palavras espero que ainda me ame, porque este é o último instante em que me amará, depois de ler estas palavras. Por isso, adeus, meu doce amor, enquanto nós ainda nos amamos. Adeus, meu querido.

Sou uma agente da MWD. Sim, sou uma agente dupla à serviço dos russos. Trabalho com eles desde um ano depois do fim da guerra. Apaixonei-me por um polonês da RAF. Ainda estava apaixonada por ele, quando você entrou em minha vida. Você pode descobrir quem é ele. Ganhou duas medalhas e depois da guerra e fez um treinamento com M, antes de ser enviado de novo para a Polônia. Lá foi preso e torturado. Desta maneira, eles souberam uma porção de coisas, inclusive a meu respeito. Então, procuraram-me e disseram que ele ficaria a salvo se eu trabalhasse para eles. Ele não sabia nada disso, mas tinha permissão para me escrever. As cartas chegavam no dia 15 de cada mês. Eu descobri que não deveria viver sem ele. Não aguentaria o fato do que poderia acontecer um dia 15 sem uma carta dele. Porque isto significaria que eu seria responsável pela sua morte. Tentei fornecer a eles o menor número de informações possível. É preciso que me acredite. Foi quando surgiu você. Informei a eles que você fora encarregado do serviço em Royale, que identidade você estaria usando, e tudo o mais. Isto explica como eles sabiam que você iria chegar e o fato de que tiveram tempo de colocar os microfones antes que você chegasse. Já suspeitavam de Le Chiffre, mas não sabiam exatamente o que você iria fazer. Só sabiam que tinha alguma coisa a ver com Le Chiffre. Isto foi tudo o que lhes informei.

Recebi ordens para não ficar atrás de você no cassino, e para fazer o possível para afastar Leiter e Mathis. Foi por isso que aquele pistoleiro quase lhe matou. Depois, tive de fingir o sequestro. Você deve ter ficado intrigado com meu silêncio na boate. Eles não me machucaram, porque eu estava trabalhando para a MWD.

Mas quando descobri o que haviam feito com você, apesar de tudo ter sido feito por Le Chiffre e ele fosse um traidor, decidi que não poderia continuar. Nessa ocasião, já começava a apaixonar-me por você. Eles queriam que eu descobrisse coisas a seu respeito, enquanto estivesse convalescendo, mas recusei-me. Eu era controlada por Paris. Tinha de ligar para um número dos Invalides duas vezes ao dia. Eles me ameaçaram; finalmente, deixaram de me controlar. Então soube que meu admirador, na Polônia, seria morto. Mas eles talvez estivessem com medo que eu falasse e me avisaram pela última vez que, se eu não obedecesse, a SMERSH viria no meu encalço. Não tomei conhecimento. Estava apaixonada por você. Então vi o homem com a venda preta no Splendide e soube que ele estivera fazendo perguntas a meu respeito. Isso aconteceu um dia antes de virmos para cá. Tive esperanças de despistá-lo. Resolvi viver uma aventura com você e depois fugir para a América do Sul. Esperava ter um filho seu e recomeçar a vida em outro lugar. Mas eles nos seguiram. Ninguém escapa deles.

Eu sabia que, se contasse a você, seria o fim do nosso amor. Cheguei à conclusão de que duas coisas poderiam acontecer: ou eu esperava que a SMERSH me matasse, e talvez matassem você também, ou me suicidava.

Eis tudo, meu querido amor. Você não pode impedir que o chame de querido amor, nem impedir que eu diga que o amo. Levo isto comigo, e a sua lembrança também.

Não posso dizer muita coisa para ajudá-lo. O número do telefone de Paris era 55200, Invalides. Nunca me encontrei com nenhum deles em Londres. Tudo era feito através de um endereço intermediário, uma agência de notícias em Charing Cross Place, n.° 450.

Na primeira vez que jantamos juntos, você falou sobre aquele homem que foi considerado culpado de traição na Iugoslávia. Ele disse: “Fui levado pelo turbilhão do mundo”. Essa é também a minha única desculpa. Isso e o amor por um homem cuja vida tentei salvar.

Já é muito tarde, estou cansada, e somente duas portas nos separam. Mas preciso ter coragem. Você poderia salvar minha vida, mas depois eu não aguentaria o seu olhar, que tanto adoro.

Meu amor, meu amor. V.”

Cassino Royale (Ian Fleming) © 1965 – Capítulo 27 – “Um Coração Sangrando de Dor”. Todos os direitos reservados à Civilização Brasileira S.A. e Grupo Editorial Record.

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